Cultura!

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OBJECTIVOS

Estes textos são uma mera justificação de gosto, dirigida em primeiro lugar aos amigos, e não são crítica de cinema, muito menos de teatro ou arte em geral... Nos últimos tempos são maioritariamente meros comentários que fiz, publicados principalmente no facebook ou no correio electrónico, sempre a pensar em primeiro lugar nos amigos que eventualmente os leiam.
Gostaria muito de re-escrever os textos, aprofundando as opiniões, mas o tempo vai-me faltando...
As minhas estrelas (de 1 a 5), quando as houver, apenas representam o meu gosto em relação à obra em causa, e nunca uma apreciação global da sua qualidade, para a qual não me sinto com competência, além da subjectividade inerente. Gostaria de ver tudo o que vale a pena, mas também não tenho tempo...

sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

PREFERÊNCIAS EM CENA, EM 2016 - AS MINHAS RAZÕES

Com base em textos que fui escrevendo quando vi os espectáculos

CLARABÓIA, de José Saramago, enc. Maria do Céu Guerra, pel' A Barraca

"Através do microcosmos de um prédio urbano, com seis apartamentos, Saramago mostra-nos o que foram esses tempos sombrios em que viveu a sua juventude (e nós também) e de como o medo que o fascismo inculcou nas pessoas as tornou por vezes medíocres, quando não até capazes de malvadezas contra o seu semelhante, como a denúncia, quase sempre falsa, por mera vingança. Mas também de esperanças e anseios que nesses tempos obscuros dificilmente podiam singrar."
"é impossível esquecer a beleza do cenário de José Costa Reis, imprescindível para permitir esta encenação, ao mostrar-nos o interior do prédio e os seus moradores. Esse facto torna este espectáculo único, quando visto na velhinha sala do Cinearte, que aliás atravessou praticamente toda a nossa existência, já um pouco longa, entre muito cinema e teatro."



12 HOMENS EM FÚRIA, de Reginald Rose, enc. Armando Caldas, pelo Intervalo Grupo de Teatro

"Tanto que este espectáculo é muito actual, embora nem sequer aflore a questão da pena de morte, ainda hoje existente nos EUA, como noutros países do mundo, que deixa marcas nos espectadores, porque emociona e principalmente faz reflectir. É um microcosmos humano que Reginald Rose no fundo cria entre aqueles 12 homens e nenhum de nós, penso, deixará de o sentir, nele se revendo, por bons ou maus motivos. No fundo é nisso que reside a intemporalidade desta magnífica obra e se nos emocionamos, eu diria quase até às lágrimas, é por vermos que desta vez a inteligência e o humanismo derrotam a ignorância, o desespero acéfalo, a violência dos que não têm outro argumento.
Eu só posso sugerir que não falhem mais este grande e belo espectáculo do Intervalo Grupo de Teatro, com uma direcção de actores que temos que reconhecer magnífica, aliás como habitualmente naquela casa."




FREI LUÍS DE SOUSA, de Almeida Garrett, enc. Rogério de Carvalho, pela CTAlmada

"Confesso que para mim, fica o horror do preconceito, criado e levado ao extremo pela igreja, que leva a que aqueles dois seres, que se amavam e amavam a filha, Maria, tivessem que se enclausurar, morrendo para a vida, com o beneplácito, intriga e aplauso da Igreja (Irmão Jorge).
Em minha opinião, Rogério de Carvalho conduziu com mestria o espectáculo para nos fazer sentir como a falsa moralidade e o fundamentalismo conduzem à infelicidade. E tudo culmina com a cena da morte de Maria que, ao contrário do pensado por Almeida Garrett, que a imaginou de branco, apenas vítima (a época era outra), nos surge agora num poderoso vermelho, da cor do sangue e da revolta, dando à cena final um simbolismo de luta anti preconceitos e falsos moralismos. Por isso julgo que o grande poeta, um dos nossos maiores, que foi Eugénio de Andrade teria apreciado esta interpretação do Frei Luís de Sousa.
Por mim gostei muito."




DE AÇO E SONHO, pelo Teatro Extremo

"Belíssimo título!
O Teatro Extremo e a Associação Conquistas da Revolução organizaram na Casa do Alentejo um magnífico espectáculo teatral sobre a Constituição da República, aprovada na Assembleia da República em Abril de 1976, há 40 anos. Com Joana Manuel, António Boieiro e Rui Galveias.
As fotos que obtive na Net são de representações desta peça noutros locais.
A leitura da mensagem de Vasco Gonçalves ao Festival de Teatro de Nancy de 1977 abre o espectáculo, que durante cerca de uma hora nos relembra o que tem sido a luta pela defesa das conquistas da Revolução de Abril e da que é a mais progressista das constituições."



HEDDA GABLER, de Ibsen, enc. Juni Dahr, pelo Viojoner Teater, Oslo (FTAlmada)
"Para quem gosta de Ibsen imagine o que se poderá fazer num espaço belíssimo como é a Casa da Cerca, espaço de exposições e eventos da Câmara Municipal de Almada, com Lisboa em fundo.

Mas o que esperávamos foi superado por esta magnífica encenação da peça HEDDA GABLER, pela encenadora e actriz norueguesa, também cineasta, Juni Dahr, acompanhada por outros 4 magníficos actores, uma mulher e três homens, do Visjoner Teater, de Oslo.

Espectáculo dito em norueguês, mas com uma tradução para português excelente e muito visível para todos quantos estavam a assistir.

Espectáculo quase íntimo, para apenas 60 espectadores por sessão, como gostava o grande dramaturgo norueguês, Henrik Ibsen, para aproximar o público dos actores e da representação.

Um longo e caloroso aplauso no final, com todos os espectadores de pé, pareceu-me até surpreender os actores, que talvez não o esperassem da parte de um público de língua tão diferente. Mas Almada é Almada e o público que criou tem uma cultura teatral invejável e rara."




A GAIVOTA, de Anton Tchecov, enc. Thomas Ostermeier, pelo Théâtre Vidy-Lausanne (FTAlmada)


"Um famoso encenador alemão, Thomas Ostermeier, regressou a Almada com uma encenação muito moderna (mas não, pelo menos na parte principal, pos-moderna... felizmente!) de uma das grandes peças de Anton Tcheckov, A GAIVOTA. 
É um grande texto que continua a suscitar interrogações e dúvidas de quem o vê representado (ou o lê) sobre o comportamento das pessoas... e dos artistas:
"Artistas!..." comenta a certa altura um dos personagens, o médico. "




TRÓPICO DEL PLATA, de e enc. Rubén Sabadini, Vera Vera Teatro, Buenos aires (FTAlmada)


"E é quase sempre através da metáfora que o autor, o dramaturgo argentino Rubén Sabadini,  nos descreve a relação de poder que se estabelece entre um homem, Guzman, e a sua amante, Aimée, uma jovem que recorre à prostituição para sobreviver numa grande metrópole, e que ele utiliza  recorrendo à violência, como proxeneta e chulo. E as relações com os clientes, burgueses que se disfarçam, se escondem, para se servir daquela mulher.
" - O mercado da carne não funcionaria sem a cumplicidade de uma sociedade patriarcal prostituta que se sabe soberana e, no carnaval da história, a violência (institucional) contra a mulher disfarça-se de escolha pessoal e torna-se invisível por detrás da máscara."
"toda a violência (dos poderosos) é política porque a vítima é aquela que é tida por inferior."
"No mínimo este espectáculo procura não agradar a tantos espectadores de classe média que frequentam o teatro para expiarem as suas culpas de burgueses silenciosos e, como tal, complacentes." - (palavras do autor, transcritas na folha da sessão)"



O ANO DA MORTE DE RICARDO REIS, de José Saramago, enc. Helder Costa, pel' A Barraca

"É de 1936 que se trata e de FERNANDO PESSOA e de um dos seus famosos heterónimos, numa genial recriação do nosso Nobel.
Creio que posso garantir-vos que se vão rir mas ao mesmo tempo relembrar com preocupação essa época difícil do nosso País, com o fascismo em ascensão aqui e em grande parte da Europa, com as suas atrocidades sem nome, os seus horrores aqui mesmo ao lado, na Espanha invadida e saqueada. 
Saramago, como genial escritor que foi, nunca se esquece de nos lembrar em que situações históricas viveram as suas personagens, reais ou imaginárias.
Interpretações brilhantíssimas, numa magnífica encenação de Helder Costa."



A ÚLTIMA VIAGEM DE LÉNINE, de António e Mafalda Santos, pelo Grupo de Teatro Não Matem o Mensageiro

"Lénine surge-nos nesta peça como um revolucionário de corpo inteiro, isto é, que não esconde a sua condição humana, o que o torna um ser extraordinário, por quem sentimos uma enorme admiração e simpatia.
A peça, que imagina uma viagem, nos tempos actuais, a Lisboa, do grande dirigente revolucionário, tem vários momentos emocionantes, muito por mérito da encenação e da interpretação. Um dos que suponho que mais toca os espectadores é o da celebração que Lénine e a sua companheira Najda Kroupskaia, fazem no 73º dia da Revolução de Outubro, dia em que ultrapassa a duração da Comuna de Paris. Julgo que ninguém que sonha com um Mundo melhor deixará de se emocionar. A Revolução haveria efectivamente de durar muito mais, algumas décadas, marcando decisivamente a História da Humanidade como um dos seus momentos mais altos, por ser a primeira vez, enquanto durou, que os trabalhadores tomaram nas suas mãos de uma maneira consequente o seu destino."




A NOITE DA LIBERDADE, de Ödön von Horváth, enc. Rodrigo Francisco, pela CTA
"Esta peça de Horváth, cujo título original é "Noite Italiana", em apoio à luta anti-fascista em Itália, contra Mussolini e seus sicários, foi escrita em 1929.

Um pouco antes portanto da chegada dos nazis ao poder na Alemanha, quando o partido nazi era ainda apenas uma ameaça e os partidos burgueses julgavam poder contê-la, apesar dos alertas dos comunistas, que defendiam a necessidade da criação de uma verdadeira frente popular contra o fascismo.

No final da peça imaginada por Horváth os jovens comunistas, que haviam sido expulsos do partido socialista dominado por políticos burgueses por apelarem à luta anti-fascista, surgem em defesa destes perante o ataque dos nazis. 

Sabemos no entanto que o anti-comunismo desses dirigentes prevaleceu nos anos seguintes, dando força aos nazis para atacarem a União Soviética, onde felizmente foram finalmente derrotados. Horváth já não viveu infelizmente para testemunhar isto, vitimado em Paris, onde se refugiara, por uma árvore em queda nos Campos Elíseos durante uma manhã tempestuosa.

A encenação de Rodrigo Francisco, pretende ligar a acção da peça à preocupante situação política e social dos nossos tempos, com o fascismo de novo a crescer na Europa e nos EUA (Trump) mas sem alterar o texto original de Horváth, o que implica um mínimo de conhecimentos por parte dos seus espectadores. 

A esperança de quem vê a peça é que ela seja bem entendida pela maioria dos seus espectadores. "




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