Cultura!

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OBJECTIVOS

Estes textos são uma mera justificação de gosto, dirigida em primeiro lugar aos amigos, e não são crítica de cinema, muito menos de teatro ou arte em geral... Nos últimos tempos são maioritariamente meros comentários que fiz, publicados principalmente no facebook ou no correio electrónico, sempre a pensar em primeiro lugar nos amigos que eventualmente os leiam.
Gostaria muito de re-escrever os textos, aprofundando as opiniões, mas o tempo vai-me faltando...
As minhas estrelas (de 1 a 5), quando as houver, apenas representam o meu gosto em relação à obra em causa, e nunca uma apreciação global da sua qualidade, para a qual não me sinto com competência, além da subjectividade inerente. Gostaria de ver tudo o que vale a pena, mas também não tenho tempo...

domingo, 1 de novembro de 2015

NA QUINTA NOITE



NA QUINTA NOITE

A 36ª Semana Cultural do Intervalo Grupo de Teatro continua a dar-nos grandes momentos, depois daquele início brilhante e quase insuperável, da homenagem ao Fernando Tavares Marques. 

Ontem foi mais uma noite que não esqueceremos, principalmente nós que somos cinéfilos, mesmo que modestos, com a homenagem a um dos nossos realizadores preferidos, e que em nossa opinião pertence ao top 10, por isso um dos nomes mais importantes do Cinema Português que, convém dizê-lo, é considerado pela crítica da especialidade, estrangeira e mais credível, como um dos mais interessantes da actualidade (Pedro Costa, Teresa Villaverde, Miguel Gomes, Manoel de Oliveira, recentemente desaparecido, etc e mais alguns novíssimos).

Jorge Leitão Ramos, crítico de cinema desde os idos anos 70 e autor do famoso Dicionário do Cinema Português (a que continua a faltar o 1º volume, dos primórdios até 1962 e uma actualização recente, obviamente) fez uma interessante cronologia da obra de José Fonseca e Costa, o homenageado dessa noite, dando-nos até a magnífica notícia de que o grande realizador não está parado e continua a filmar "Axilas", escrito em conjunto com Mário Botequilha, o autor da notável peça "Al Pantalone", que o Miguel Seabra encenou para o Teatro Meridional e ganhou o prémio do público em 2014 no Festival de Teatro de Almada, de que aliás gostámos muito de ver este ano, com honras de espectáculo de encerramento, naquele que é um dos mais importantes festivais de teatro por esse mundo fora.

Em 1971 Fonseca e Costa realizou a sua primeira longa-metragem, um surpreendente "O Recado", que era um recado contra o fascismo salazarista que então continuava a asfixiar e destruir aos poucos o nosso País e o melhor no nosso povo. A terrível, omnipresente, muitas vezes tacanha (provocando até às vezes as risadas dos censurados), a sempre medíocre censura deixou-o passar praticamente incólume por pensar provavelmente que não chegaria ao "bom povo português", como os fascistas gostavam de caracterizar um povo revoltado mas amordaçado de quem os melhores eram lançados nas prisões depois de torturados e muitas vezes assassinados.

Poucos dos espectadores desta noite cultural se terão dado conta (e o homenageado só no final) da presença entre os que esgotaram o auditório Lourdes Norberto, de outro nome grande do cinema português, o decano dos produtores portugueses e às vezes também actor (como no magnífico "Tabu", de Miguel Gomes), Henrique Espírito Santo. É que ele participou nos anos 50 e 60, com José Fonseca e Costa, no movimento cine-clubista, tendo ambos feito parte da mesma direcção do Cine-Clube Imagem, e pouco depois ambos seriam presos pela PIDE, acusados de "actividades subversivas", conduzidos ao Aljube, em trânsito para Caxias, onde Henrique Espírito Santo estaria um ano e meio. Mas o fascismo não os conseguiu destruir ou amedrontar e ambos participaram nos primeiros projectos de José Fonseca e Costa no cinema, nomeadamente na curta-metragem "Regresso à Terra do Sol", realizada em Angola (1967), donde o realizador é natural, e da longa-metragem já citada "O Recado" (1971), nas quais Henrique Espírito Santo foi o Director de Produção. Ambos fariam depois notáveis carreiras, cada um na sua especialidade, e tendo o segundo colaborado nalgumas das obras do realizador, nomeadamente em "Balada da Praia dos Cães" e "Cinco Dias Cinco Noites". 

Não quero concluir esta nota sem referir que as minhas obras preferidas entre as realizadas por José Fonseca e Costa e que considero aliás grandes filmes da cinematografia portuguesa, são o já citado "O Recado" (72), "Kilas, o Mau da Fita" (80), "Sem Sombra de Pecado" (83), "A Balada da Praia dos Cães" 

(adaptando o romance homónimo de José Cardoso Pires) (87), "Cinco Dias Cinco Noites" (adaptação da novela homónima de Manuel Tiago, pseudónimo de Álvaro Cunhal) (96) e não esquecendo uma obra injustamente esquecida, mas que Jorge Leitão Ramos citou, que é "Viúva Rica Solteira Não Fica" (2006), filme de que gostei muito a quando da estreia, apesar das reticências da maior parte da crítica. 

E, na segunda parte deste evento cultural, surgiu o excepcional momento musical com o concerto dado por um dos maiores nomes da actual Música Portuguesa, Camané. Foi brilhante em várias interpretações do seu magnífico repertório. É que não é só a voz que é de superior qualidade, são também os textos dos seus fados e canções que são muito interessantes. Foi um fecho para o qual é difícil arranjar palavras, dada a sua enorme qualidade artística.

Obrigado, ao Intervalo Grupo de Teatro e a todos os que o compõem, por mais esta noite memorável.





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