Cultura!

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OBJECTIVOS

Estes textos são uma mera justificação de gosto, dirigida em primeiro lugar aos amigos, e não são crítica de cinema, muito menos de teatro ou arte em geral... Nos últimos tempos são maioritariamente meros comentários que fiz, publicados principalmente no facebook ou no correio electrónico, sempre a pensar em primeiro lugar nos amigos que eventualmente os leiam.
Gostaria muito de re-escrever os textos, aprofundando as opiniões, mas o tempo vai-me faltando...
As minhas estrelas (de 1 a 5), quando as houver, apenas representam o meu gosto em relação à obra em causa, e nunca uma apreciação global da sua qualidade, para a qual não me sinto com competência, além da subjectividade inerente. Gostaria de ver tudo o que vale a pena, mas também não tenho tempo...

segunda-feira, 23 de junho de 2014

ENEMY (O HOMEM DUPLICADO)

O HOMEM DUPLICADO, de Denis Villeneuve


Uma adaptação de um belo romance de José Saramago, que em 2003, segundo a "Publish Trends", foi o quinto livro mais vendido no mundo. 
Os méritos da obra literária já são conhecidos. Valerá a pena reler o que sobre ela escreveu o próprio autor em "A Estátua de Pedra" (pág 41) ou as referências à mesma, no mesmo título (pág 50), de Fernando Goméz Aguilera, o programador da mais bela das exposições que conheço sobre o nosso Nobel, "A Consistência dos Sonhos", em 2008, no Palácio da Ajuda. Quase que tenho vontade de transcrever mas deixo-o aos interessados. 
Pessoalmente só queria deixar expresso o quanto me interessa a maneira como o grande escritor revisitou os grandes mitos da natureza humana, como aqui o do eu e do outro, e de como as coisas se podem complicar se o outro se transforma, pelo menos nalguns aspectos, no eu que somos. É um tema que sem dúvida fascina quase todos os seres humanos  e que Saramago nos deu com a mestria e inteligência habituais.
A adaptação de mais esta obra brilhante de Saramago é de Denis Villeneuve, um cineasta canadiano, do Quebec, de que havíamos visto, ainda não há muito, um excelente PRISONERS (Raptadas), inquietante thriller sobre o desaparecimento de crianças, por rapto ou assassinato, em crimes de índole sexual, como a pedofilia, ou de tráfico de órgãos e o perigo que representam os que pretendem fazer justiça pelas próprias mãos, tornando-se tão criminosos, ou mais, que aqueles que querem punir.
Villeneuve fê-lo bastante bem, atendendo à complexidade dum tema em que a literatura tem óbvias vantagens. Mas consegue interessar-nos e até inquietar-nos ao longo do seu filme. Julgo que Saramago teria gostado desta interpretação da sua obra. 
As interpretações do conhecido Jake Gyllenthaal, acompanhado de três belas actrizes, uma delas é a famosa Isabella Rossellini, no papel da Mãe, são magníficas e não se perde até um certo erotismo subtil, muito saramaguiano. Mas para saber isso é preciso tê-lo lido...  


sábado, 21 de junho de 2014

31º FESTIVAL DE ALMADA

Principalmente para os que gostam de Teatro
De 4 a 18 de Julho



Ver programa em:

http://www.ctalmada.pt/festivais/2014/programa_festival_2014.pdf





A VIDA INVISÍVEL

A VIDA INVISÍVEL, de Vitor Gonçalves 



O comentário segue dentro de momentos.

Pretendia escreve-lo assim que visse o filme, num cinema como quase sempre faço. E na minha cidade só é possível vê-lo num único ecrã(!): questões da distribuição que temos. Mas alguns amigos cinéfilos, em cujo gosto confio, tinham-me avisado na urgência de ver esta obra. 
E a verdade é que há 4 dias tento vê-la sem sucesso e sou obrigado a adiar a escrita da minha nota sobre ela. 
É que "avariou a máquina" indispensável á projecção! É "mais um malefício do digital!", foi assim que me avisaram os trabalhadores da sala. 
E aqui continuo, com a minha nota a aguardar e o post em suspenso... Desculpem.

NOTA À POSTERIORI

“Já vi e gostei. A não perder para quem goste de Cinema. Só depois de ver o filme li palavras do autor ou dos críticos. E há uma frase do cineasta que não esqueço: " a dimensão solitária de cada um de nós (...)" que julgo, na minha modesta opinião, ter a ver com o mais profundo da obra.” (comentário no Facebook, em 1-Jul-2014)
Espero dentro de dias acrescentar algo a esta nota, dando conta da análise e consequentes reflexões, muito pessoais, a este filme cujos efeitos continuam a permanecer na zona activa do meu cérebro... 
Mas entretanto recomendo a visão aos que gostam de cinema e de sobre ele pensar.

quinta-feira, 19 de junho de 2014

FADING GIGOLO

FADING GIGOLO (Quase Gigolo), de John Turturro

Consegue pelo menos fazer sorrir, apesar de eu não ser versado em cultura judaica, em especial da Diáspora, donde provavelmente me terão escapado algumas das piadas na estória desta carismática dupla: Woody Allen, aqui só actor e John Turturro, que escreveu, realizou e também interpreta. 


Tudo se passa num bairro judeu nova-iorquino, muito tradicionalista, onde um velho livreiro alfarrabista (Woddy Allen) e o seu empregado (John Turturro) resolvem, por razões económicas resultantes da crise financeira, serem respectivamente o proxeneta e o seu gigolo, entrando em choque com o conselho dos rabinos, que os querem julgar por comportamento pouco moral e ético. 

Se dissermos que entre as actrizes presentes está Sharon Stone, o espectador adivinha os possíveis sorrisos pelas alusões a outras famosas interpretações da actriz.


Gostava de lembrar que Turturro tem alguns papéis e colaborações com grandes cineastas, nomeadamente com Spike Lee e com os manos Coen, aliás em obras de culto, por exemplo: "Barton Fink", dos Coen e "Summer of Sam", de Spike Lee.

Uma obra obviamente sem grandes pretensões de um ponto de vista cinematográfico mas que pelo menos não ofende a inteligência e se vê com interesse, até pelos desempenhos dos actores e actrizes presentes, que são quase todos excelentes. Vejo as estrelas da crítica e não deixo de ficar espantado pela discriminação e incoerência. Mas isso são outras histórias...

terça-feira, 17 de junho de 2014

MARX NA BAIXA

MARX NA BAIXA, uma peça com tradução e adaptação de António Santos, encenação de Mafalda Santos e interpretação de André Levy - uma jovem equipa que partiu de uma peça de teatro já com múltiplas representações nos 5 continentes, MARX IN SOHO, escrita em 1999 por um multifacetado intelectual (professor, historiador, escritor, dramaturgo) norte-americano, mais concrectamente estado-unidense, Howard Zinn (24-Ago-1922 – 27-Jun-2010).


Trata-se de um interessantíssimo texto sobre um dos mais famosos e importantes revolucionários e filósofos da História da Humanidade, Karl Marx (Tréveris, Renânia, 5-Mai-1918 – Londres, 14-mar-1883), nascido alemão, de ascendência judaica, mas que se viria a transformar num cidadão do Mundo, e que dedicou toda a sua vida a estudá-lo, a tentar compreendê-lo e ao sistema capitalista e seus mecanismos de exploração dos trabalhadores. E o que haveria a fazer para combater esse sistema económico predador dos homens, nos seus efeitos perversos e depois para o erradicar. 

Mais de um século depois Marx continua a ter toda a razão, quer na sua análise científica, quer nas soluções que preconizou (obviamente que os que defendem a exploração, ou os que são pagos, em geral principescamente, para o fazer, dizem o contrário, quase sempre sem argumentos, que aliás dependem também do ponto de vista da classe social de onde são aduzidos).


Apesar do seu carácter eminentemente político, a peça prende irresistivelmente os espectadores, até porque nos põe perante um Marx (André Levy magnífico) que não só nos fala do nosso tempo como se apresenta como um homem com os problemas de qualquer ser humano, a despeito da sua inteligência superior, da sua genialidade, homem que tem família, com todos os problemas que ela sempre traz, de relacionamento, de educação dos filhos, de sobrevivência, e ao mesmo tempo é perseguido e ostracizado pelos poderosos. Porém ele não se cala, nem se rende, ainda que o tentem esmagar, cortando-lhe até nos meios de subsistência económica, através do desemprego, da perseguição sistemática, do exílio forçado, e deixa-nos uma obra admirável que o tempo não corrói, antes comprova. (**)

Há neste belíssimo espectáculo meia dúzia de passagens (cenas) que tocam muito o espectador atento. Entre eles o da Comuna de Paris, ou das reflexões sobre a religião ou as ditaduras, que talvez despertem nos espectadores o desejo, ou a necessidade, de ler (ou reler) os grandes textos de Marx.


Deve salientar-se que do espectáculo não está afastado algum humor, que o próprio Karl Marx tinha, e que nos aproxima ainda mais da figura do grande filósofo, que muitos dos seus pares consideram um dos maiores da História.

Estas são as principais razões que me levam a sugerir uma ida urgente ao velhinho Cinearte, sala onde está sediada desde há muitos anos a carismática companhia de teatro, popular no melhor sentido da palavra, A BARRACA, de Maria do Céu Guerra e Helder Costa e da sua equipa, com a sua magnífica continuadora Rita Lello, aliás Companhia também em luta pela sua sobrevivência nestes tempos de exploração capitalista feroz e acrescida e de mediocridade e incultura generalizada entre os (des)governantes. 

Marx em Lisboa, na Baixa, no país, na decrépita Europa, no resto do Mundo onde ainda não chegou, é urgente!


(*) Nota: Desculpem. Não é falsa modéstia. É que não gosto de ser tomado pelo que não sou. Para não haver confusões reitero que sou apenas um interessado cidadão e espectador de teatro (ou de cinema, ou de outras artes visuais), que gosta de sugerir aos amigos o que viu, leu ou ouviu e achou muito bom. Por isso este texto não é uma crítica de teatro, e muito menos tem pretensões de erudição, seja do que for (gostaria de ter mas não tenho...). É pois e só uma nota de gosto, o que escrevo.

(**) “Porque não te calas tu?!”, lembrei-me da frase lançada pelo tal rei asquerosamente medíocre, reinando numa corte e num país em que corrupção grassa (na própria família mais directa), sobre o que julgava ser um súbdito temeroso. Insulto baixo que os desprezíveis lacaios prontamente aplaudiram... e os presentes lamentavelmente não tiveram coragem de censurar)





segunda-feira, 16 de junho de 2014

URBANO TAVARES RODRIGUES - Exposição na Biblioteca Nacional Portuguesa

MEMÓRIA

URBANO TAVARES RODRIGUES (1923-2003)
















Amig@s, a não faltar, se puderem, à exposição sobre o grande escritor e o cidadão sem mácula, que está patente na Biblioteca Nacional de Portugal, em Lisboa, até ao final de Junho (dia 28).

Pena é que não tivesse sido publicado um catálogo!

É com emoção, de leitores e contemporâneos, sempre admirando a sua obra e o seu comportamento cívico, que percorremos a exposição, que não terá o enquadramento que julgo que Urbano mereceria, e que esperamos que um dia ainda venha a ser realizada, mas não deixa de ser mais uma bela homenagem. Vendo muitas das primeiras edições dos seus livros - no ensaio, na crítica, na ficção, vendo várias fotografias do escritor, da família, dos amigos, do casal mítico dos anos 60, Urbano e Maria Judite, lendo muitos escritos pelo seu punho, olhando a sua pequena máquina de escrever, instrumento que as novas gerações desconhecem nas suas dificuldades, no papel gasto, mas de uma certa magia no entanto... para quem o utilizou.

Como forma de homenagem pessoal juntamos alguns documentos nossos, de obras muito amadas e de acontecimentos que nunca esqueceremos da luta anti-fascista, nas primeiras eleições em que participámos (1969), votando pela CDE, embora tendo completa consciência da farsa eleitoral que o acto constituiu, mas sabendo que não deixava de ser um abanão mais no regime fascista e um contributo da luta para o ganhar de mais consciência por muitos. E menos de cinco depois o regime era finalmente derrubado, pelo movimento dos militares democratas e revolucionários, imediatamente apoiado pela esmagadora maioria do povo, dando origem à Revolução de Abril.



CARTAS DE AMOR DE SÓROR MARIANA – UMA FREIRA PORTUGUESA APAIXONADA



CARTAS DE AMOR DE SÓROR MARIANA – UMA FREIRA PORTUGUESA APAIXONADA

Uma recomendação: não perder até ao fim do mês (sextas e sábados às 21.30) mais este belo espectáculo do INTERVALO GRUPO DE TEATRO, em Linda-a-Velha, no carismático (mercê do que nele se tem assistido) Auditório Municipal Lourdes Norberto.

Armando Caldas, o encenador, demonstra aqui uma vez mais a sua mestria neste tipo de espectáculo, aliás como em outros géneros, neste monólogo para uma actriz, que diz as cartas de amor da freira de Beja, Mariana Alcoforado, que ali nasceu em 22-Abr-1640, ano da Restauração da Independência de Portugal, e que em 1651, com apenas 11 anos, foi encerrada pelos pais, gente muito rica, no Mosteiro de Nossa Senhora da Conceição da cidade, onde irá permanecer toda a vida.

A partir de 1663, tropas francesas vêm ajudar o governo português a defender-se das incursões espanholas através do Alentejo na tentativa de voltarem a ocupar o país. É assim que em 1666, tinha então Mariana, já freira, 26 anos, chega um oficial francês, Noel Bouton, conde e marquês (de Chamilly) por quem ela se irá apaixonar. 

Em que condições se conhecem não há certezas. Se chegam a ter relações sexuais tão pouco o saberemos. O que se sabe é que Mariana escreve cinco desesperadas cartas de amor ao marquês, as quais serão em 1669 publicadas em França por um escritor, de nome Lavergne de Guilleraggues, a quem inicialmente atribuíram a sua autoria, tese defendida por muitos intelectuais da época, e que veio a ser depois contestada atendendo à sintaxe nelas utilizada, mais perto da língua portuguesa. Hoje são consideradas como efectivamente escritas por uma mulher, que seria Mariana de Alcoforado.

A beleza da escrita, a descrição dos sentimentos, tornaram-nas objecto de interesse, e até paixão, de muitos escritores, poetas e pintores ao longo de mais de 3 séculos. A tradução utilizada por Armando Caldas é a de um dos grandes poetas portugueses do século XX, Eugénio de Andrade.

Julgo que o que seduz muitos, e a mim também, é o despertar do amor físico, numa mulher muito jovem, enclausurada num convento, e a gama de sentimentos que uma situação dessas origina: desejos de liberdade, desejos de amor, esperança e depois frustração, desespero e renúncia, perante a aparente impossibilidade de libertação.

O que é mais admirável nesta encenação de Armando Caldas é que contando com uma actriz ainda mais jovem, 21 anos, conseguiu obter dela uma representação de todos esses estados de espírito. Porque quanto à grande qualidade, e bom gosto, do cenário, das movimentações da actriz em cena, da utilização da iluminação, das imagens de vídeo, a isso já ele nos habituara de encenações anteriores.

Lembrar ainda que Adriana Rocha, a actriz, já nos surpreendera pela qualidade da interpretação, noutro desempenho a solo, e muito diferente deste, no “Diário de Uma Criada de Quarto”, de Octave Mirabeau, que Armando Caldas encenou em 2013, no mesmo espaço.



domingo, 1 de junho de 2014

O DOIDO E A MORTE, de Raul Brandão

SOBRE “O DOIDO E A MORTE”

Exactamente cinco anos depois revi no TMJB  (Teatro Municipal Joaquim Benite, em Almada) o espectáculo de teatro e ópera, brilhantemente concebido em 2009 por Joaquim Benite e que em 2014 é encenado pelo seu jovem assistente de então e agora seu continuador à frente da CTA (Companhia de Teatro de Almada).
A direcção musical continua a ser do autor da ópera, o compositor Alexandre Delgado, tal como o cenário da responsabilidade de Jean-Guy Lecat.
Pouco tenho a acrescentar à minha nota de simples espectador escrita em Junho de 2009 (ver abaixo). Desejo apenas salientar que, para mim, este espectáculo é simultâneamente inovador e didáctico, ao pôr em paralelo, e por vezes misturar, duas artes de palco, o teatro e a ópera, partindo de um mesmo texto, o da peça de Raul Brandão. Voltei a sentir, até por comentários murmurados por mim ouvidos, o fascínio do público quando se apercebeu que uma personagem, Nunes, era representado nas duas versões – a teatral e a operática, de maneira idêntica e pelo mesmo actor (Miguel Martins, tal como há 5 anos).
No conjunto mantiveram-se os principais actores, mudaram alguns cantores, mudaram todos os músicos mas a grande qualidade do espectáculo pelo menos manteve-se, com o nível dos desempenhos a  atingir o elevado nível que é habitual nos trabalhos desta Companhia.
Em suma, para mim “O Doido e a Morte”, de Raul Brandão, Alexandre Delgado e Rodrigo Francisco já está na lista do melhor que vi este ano e poderá nela permanecer apesar da fortíssima concorrência do que ainda aí virá, para já no incontornável Festival de Teatro de Almada.


Texto de 2009:

PROPOSTAS CULTURAIS E NÃO SÓ

Nº 25/09_2JUN09

Conforme já várias vezes escrito, estes textos são uma mera justificação de gosto, dirigida exclusivamente aos amigos, e não são Crítica! Muito menos de Cinema, Teatro ou Arte…

TEATRO

“O DOIDO E A MORTE” (1923), de Raul Brandão, encenações de Joaquim Benite, para a representação da peça pela CTA, e para a ópera de Alexandre Delgado.
Mesmo palco, mesmo cenário (magnífico, de Jean-Guy Lecat, para o enorme e belíssimo palco do TMA), um actor comum – Manuel Martins, em Nunes, o secretário do Governador Civil, para as duas representações – teatro e ópera - do famoso texto de Raul Brandão (1867-1930), ideia brilhante de Joaquim Benite e da CTA/TMA. Ambas muito bem conseguidas, com interpretações magníficas.
Quanto à peça, considerada por muitos como uma das grandes obras-primas do teatro português, apesar da sua curta duração, continua a surpreender-nos pela sua modernidade, pela sua crítica, por vezes mordaz, mas também pelo riso que provoca, sobre a sociedade em que vivemos e os seus actores principais: ”Confesso que menti… menti sempre que pude. Toda a minha vida foi uma mentira pegada.” (Governador Civil, perante a hipótese de morrer se o Senhor Milhões chegasse a cumprir o prometido, premindo o detonador da bomba de elevada potência, e perante a fuga de familiares (esposa) e todos os subordinados, incluindo o fiel Nunes), e sobre as profundas desigualdades dessa sociedade, há um século, ou hoje…
Em 1926, quando estreou no Teatro Politeama, em Lisboa, em benefício dos vendedores de jornais, quiseram suprimir-lhe a frase final “Ai o grande filho da puta!”, para não ferir “ouvidos delicados”, provavelmente dos beneméritos presentes, e fizeram descer o pano antes que o actor tivesse tempo de a pronunciar… No entanto, o sentido da obscenidade é ambíguo já que “o filho da puta” (O Doido), está afinal bem mais perto de nós, dos nossos anseios e sonhos, do que quem pronuncia a frase (O Governador).
Eram os tempos agitados dos finais da Primeira República, em que a extrema-direita aproveitava as debilidades do regime, e o descontentamento popular, para criar as condições que lhe permitissem o golpe definitivo contra o regime democrático, já muito periclitante, depois da primeira tentativa, apoiada pelas forças mais reaccionárias, e protagonizada por Sidónio Pais (1917-18). O golpe aconteceu nesse mesmo ano (1926), em 28 de Maio, dando origem ao estado fascista, consolidado com a aprovação da Constituição de 1933, já com Oliveira Salazar no poder.


2-Jun-2009