Cultura!

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OBJECTIVOS

Estes textos são uma mera justificação de gosto, dirigida em primeiro lugar aos amigos, e não são crítica de cinema, muito menos de teatro ou arte em geral... Nos últimos tempos são maioritariamente meros comentários que fiz, publicados principalmente no facebook ou no correio electrónico, sempre a pensar em primeiro lugar nos amigos que eventualmente os leiam.
Gostaria muito de re-escrever os textos, aprofundando as opiniões, mas o tempo vai-me faltando...
As minhas estrelas (de 1 a 5), quando as houver, apenas representam o meu gosto em relação à obra em causa, e nunca uma apreciação global da sua qualidade, para a qual não me sinto com competência, além da subjectividade inerente. Gostaria de ver tudo o que vale a pena, mas também não tenho tempo...

segunda-feira, 31 de maio de 2010

BAD LIEUTENANT, de Werner Herzog

“BAD LIEUTENANT” (Polícia Sem Lei), de Werner Herzog, **** (4)

Uma terrível ironia de Herzog sobre os EUA do nosso descontentamento. Drogados, alcoolizados, passadores, gangsters, gente que se prostitui… O detective McDonagh, depois de um acto heróico de salvar, com danos físicos para si, um traficante de droga de morrer afogado na prisão, no rescaldo do furacão Katrina, em Nova Orleães, acto que lhe valerá uma medalha, vai tornar-se um drogado, através dos medicamentos que começa a tomar para diminuir as dores nas costas com que ficou depois do salvamento.
E a necessidade do consumo leva-lo-à a comportar-se como um marginal, tal como qualquer outra vítima deste flagelo social, que precise de dinheiro para arranjar droga, não interessa como, desde o assalto de rua, a alvos fáceis - jovens casais saídos das discotecas, ao desvio de droga apreendida nas esquadras, ao envolvimento com o mundo crime, cuja principal actividade passou a ser o tráfico.
Ao longo do seu calvário, entre droga e corrupção, McDonagh irá, no final do filme, suprema ironia de Herzog, receber segunda medalha, por não ceder a um colega corrupto, o que é considerado pelas chefias como um acto relevante na luta contra a corrupção, numa sociedade em que ela reina, como aliás a obra mostra com clareza.
O cineasta é excelente nas cenas de alucinação (com as iguanas) do polícia drogado, magnífica interpretação de Nicolas Cage, um homem acossado pelo consumo, de que não consegue libertar-se. Situação limite, tão do agrado de Werner Herzog.
**** (4)

terça-feira, 25 de maio de 2010

LEBANON, de Samuel Maoz

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“LEBANON” (Líbano), de Samuel Maoz (ISR), ** (2)

Tal como “Valsa com Bashir” (****), do também israelita, Ari Folman, “Lebanon” é uma obra autobiográfica.
Em termos de linguagem os filmes não são todavia comparáveis – o de Folman é de animação. São no entanto ambos documentos de guerra, mas em que a “Valsa de Bashir” tem um enquadramento histórico que o torna muito mais interessante.
“Lebanon” decorre no espaço claustrofóbico do interior de um tanque de guerra, onde cabem quatro soldados, com funções específicas, e onde, durante algum tempo, é transportado um soldado israelita morto, que vai ser hélio-transportado, um activista sírio preso por engano e por último um dos quatro soldados que acaba por morrer vítima de um ataque.
No entanto as razões da guerra nunca são expostas, a utilização de armas tóxicas pelo exército israelita é referida de raspão, o desprezo pelas vidas civis ou a diferença de meios militares entre invasores (Israel) e invadidos nunca é referida.
Resta a proeza em “Lebanon” de ser filmado no interior de um tanque (ou simulando-o) e o horror da guerra, que atinge o espectador com rara violência.
A cena das ameaças de tortura feitas pelo mercenário fascista, das milícias cristãs libanesas (extrema-direita) ao prisioneiro sírio, acorrentado pelos israelitas no interior do tanque, é terrível e fez-nos lembrar descrições semelhantes na belíssima obra que li recentemente, também autobiográfica, “Digam-me como é uma árvore – dos cárceres franquistas à liberdade”, do poeta espanhol, Marcos Ana, preso durante 23 anos nas prisões fascistas espanholas, desde a Guerra Civil. Atrocidade e crimes contra a humanidade cometidos pelos franquistas, que o juiz Baltazar Garzón pretendia julgar, o que lhe valeu para já a suspensão das suas funções, impossibilitando-o portanto de prosseguir os seus objectivos (em 2010!), o que revela que existem forças poderosas na sociedade espanhola actual que não desejam a investigação e julgamento dos crimes do franquismo (e já passaram 35 anos desde a restauração da Democracia em Espanha!).
A ver.
** (2)

quinta-feira, 20 de maio de 2010

ILHA DA COVA DA MOURA, de Rui Simões



“ILHA DA COVA DA MOURA”, de Rui Simões, **** (4)

Um magnífico documentário sobre a Lisboa Século XXI, de Rui Simões, depois do excepcional “Ruas da Amargura” (*****).
Um olhar sem preconceitos sobre a comunidade imigrante cabo-verdiana, num dos seus bairros de eleição, a Cova da Moura, na Buraca, Câmara da Amadora, Grande Lisboa. É a 11ª ilha de Cabo-Verde, dizem alguns dos seus habitantes, gueto, mas não por vontade deles.
Há afinal mais solidariedade naquele bairro, que alguns consideram problemático, que nos burgueses bairros lisboetas, em que os vizinhos não se falam, se ignoram, entre eles não existe nada. Na Cova da Moura, até as casas, clandestinas, foram resultado de um trabalho colectivo, onde mesmo as crianças colaboraram.
O autor, limita-se a estar por detrás das câmaras e das perguntas, e não se põe em bicos de pés, como fazem os mediáticos entrevistadores da TV, de todos nós infelizmente sobejamente conhecidos.
Para nós foi também bom, mas não surpreendente, revermos o Dr. Carlos Simões, sempre empenhado no apoio às populações carenciadas dos bairros considerados mais problemáticos. Intervenção curta, que passou despercebida a quem não o conheça, comentando o difícil relacionamento da polícia com os habitantes.
Documentário de visão recomendável principalmente aos que se deixam influenciar pelas mentalidades racistas e xenófobas, de que a comunicação social (incluindo a pública!), não poucas vezes, serve de veículo. Talvez, por uma vez, cheguem à conclusão que afinal a solidariedade existe onde menos esperavam.
**** (4)

Adenda

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"Bairro problemático? Dor de cabeça para as autoridades? As queixas existem, principalmente por parte dos jovens que lá habitam - abusos por parte das autoridades, racismo, invasão domiciliária pela polícia e violação dos seus direitos enquanto cidadãos que aqui trabalham. É verdade.
Mas, no final, a ideia que fica é a de que os seis mil habitantes do bairro vivem no melhor dos dois mundos. Vive-se um Cabo Verde recriado nas ruas, nas festas, bailes de funaná, festas de Colá Sanjon, almoços com cachupa, casamentos, nascimentos, mortes, funerais. E depois, cedo pela manhã, atravessa-se a estrada e apanha-se o autocarro para um outro mundo:  o do trabalho, nas limpezas, na construção civil, nos supermercados, na Lisboa bem portuguesa.
O pedaço de Cabo Verde não é recriado. É real. Como são as maçarocas de milho colhidas nas hortas dos baldios. O realizador acompanha a vida de vários jovens nascidos no bairro, famílias fundadoras, histórias de casas inteiras construídas pela noite dentro, uma espécie de Djunta-Mon, carregando cimento e tijolos, levantando paredes. Vidas cruzadas. Uma luta constante pela sobrevivência. Outras estendendo o braço solidário, como os fundadores da Associação Moinho da Juventude.
Há gente feliz na Cova da Moura. Na verdade, há uma qualidade de vida só igualável à que deixaram para trás, nas ilhas. Tambores e som de búzios, vizinhança da terra. Gente feliz com estórias: cabo-verdianos, portugueses retornados das ex-colónias, guineeses muçulmanos, angolanos, santomenses, de outras Áfricas e do Leste Europeu.
 (Diáspora/Cinema - Ilha da Cova da Moura", de Joaquim Arena, em Notícias de Cabo Verde)

TROILO E CRÉSSIDA, de William Shakespeare



“TROILO E CRÉSSIDA”, de William Shakespeare, encenação de Joaquim Benite, para a CTA, ***** (5)

Acima de tudo uma peça surpreendentemente cáustica, do mestre inglês, em que os heróis gregos como Aquiles e Ajax, são metidos a ridículo.
“Em nenhum outro drama de Shakespeare os heróis se entregam a uma análise tão violenta de si próprios e do mundo.” (Jan Kott  (1914-2001), professor universitário e famoso estudioso da obra do dramaturgo)  (lido no MaisTMA nº7).
O amor, entre Troilo e Créssida, termina mal, nesta tragicomédia, ainda que nenhum dos dois morra. Mas as grandes personagens da peça são afinal, para além de Ulisses e Heitor (este que acaba morto, traiçoeiramente pelos homens de Aquiles), Pândaro, o alcoviteiro tio de Créssida (magnífico André Gomes) e o bobo Térsito (excepcional interpretação de Carlos Pereira), que vai dizendo todas as verdades.
“Grande mas terrível peça na qual todo o maravilhoso poder da linguagem de Shakespeare parece consagrado a um só e único sentimento: um profundo desgosto em face da natureza humana, da sua grosseria, da sua estupidez, da sua falsidade, da sua futilidade” (Trevor Roper, citado por Mário Barradas, o grande homem de teatro, que a morte impediu que levasse a cabo o seu projecto de encenar esta peça.)
“É uma «comédia negra», uma «black comedy» que faz certamente rir mas que revela o que de mais cínico e sarcástico existe na natureza humana” (Mário Barradas).
A CTA (com a colaboração da C.T.do Algarve e da C.T. de Braga), os 20 actores em palco, com alguns desempenhos com a qualidade superior a que a companhia já nos habituou, e o encenador Joaquim Benite, fizeram mais um belíssimo espectáculo, a não perder.
Há textos excelentes sobre a peça, publicadas pela CTA, no caderno respectivo (nº42) e também no referido boletim “MaisTMA”.
***** (5)

domingo, 16 de maio de 2010

IL GATTOPARDO, de Luchino Visconti (1963)

Uma nova cópia vai ser exibida no Festival de Cannes deste ano, já a decorrer. Em Março de 2006 havíamos visto a cópia restaurada, finalmente na versão original deste filme, a italiana,  e que é uma das inesquecíveis obras-primas de Luchino Visconti, um dos grandes mestres da Sétima Arte.
Sem a dobragem em inglês e os cortes vários feitos nos EUA, pretensamente para agradar ao público norte-americano, que consideram algo limitado, o que daria vontade de rir, se não fosse lamentável. E essa foi a versão que correu neste país até 2006, inclusive na TV.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

GREENBERG, de Noah Baumbach

“GREENBERG”, de Noah Baumbach, (EUA), **** (4)

Depois do muito interessante “A Lua e a Baleia” (The Squid and the Whale) (2005), uma nova obra deste cineasta nova-iorquino, mas desta vez passada em LA, para onde o seu personagem principal, Roger Greenberg (magnífico Ben Stiller), que nos últimos tempos se dedicava à carpintaria como trabalhador independente para sobreviver, e é um jovem quarentão desadaptado, com problemas psicológicos, vai ficar uma temporada, na vivenda do irmão, um bem sucedido quadro superior de uma qualquer grande empresa, casado e com filhos, que entretanto foi de férias para o Vietname (“eles têm e-mails?”, pergunta a cunhada antes de partir), e que não perdoa ao irmão o seu insucesso na vida, desde que este falhou na carreira de músico de um grupo pop, por não querer aceitar as condições do mercado discográfico, que exploram os jovens músicos em início de carreira. O relacionamento de Roger com Florence (fascinante Greta Gerwig), que trabalha como ajudante doméstica em casa do irmão, e que havia ficado com a incumbência de tratar o velho cão dos Greenberg, com problemas de saúde (tem sida, diz um dos jovens, com álcool e cocaína a mais, na festa de despedida da sobrinha de Roger), irá despoletar novos problemas.
Um filme, ao melhor estilo do cinema independente, que olha com inteligência, sensibilidade e algum humor, seres desadaptados de uma sociedade cada vez menos aceitável em termos humanos em certas partes do mundo (como a nossa e a deles…)
Ao contrário do que li numa crítica do “Público”, o que Noah Baumbach deixa transparecer é um certo desprezo pelos aparentemente bem sucedidos, numa sociedade, que, nos seus principais aspectos – sociais e humanos, é bastante egoísta e medíocre (“eles não querem é trabalhar!”, “não queremos pagar-lhe o rendimento mínimo e o subsídio de desemprego deve ser reduzido no máximo (mesmo que tivessem descontado para isso)!”, “o António Mexia é competente!”, “não interessa quanto custa ao Estado a estadia do Papa! É preciso é que ele venha!”, etc, etc). E a nossa simpatia, acaba por isso, por ir inteira para os seus dois personagens principais, meio falhados de acordo com os padrões vigentes.
Entre as várias cenas magníficas deste filme relembro a título de exemplo a do impulso em seguir as duas desmioladas jovens que vão fazer mergulho para a Austrália.
Foi exibido no Indie deste ano e recomendo a sua visão, agora que está em exibição comercial.
**** (4)

segunda-feira, 10 de maio de 2010

UMA DÉCADA DE FILMES

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Os 10 filmes preferidos, na década 2000-2009:
A Vida é Um Milagre, Emir Kusturica;
Che, Steven Soderbergh;
Hero, Zhang Yimou;
Lady Chatterley, Pascale Ferran.
Les Égarès, AndréTéchinè;
New World, Terrence Malick;
O Vento Levar-nos-à, Abbas Kiarostami;
Saraband, Ingmar Bergman;
Summer of Sam, Spike Lee;
Vera Drake, Mike Leigh;

Mas há também Tim Burton, Pedro Almodovar, Woody Allen, Robert Altman,
Agnès Varda, Abdeltatif Kechiche, Martin Scorsese, Arnaud Desplechin, Terence Davies, Alain Resnais, Teresa Villaverde, João César Monteiro, Manoel de Oliveira, Clint Eastwood, Walter Salles, Raoul Ruiz, etc.

E os Portugueses (só longas metragens):

Milagre Segundo Salomé (O), Mário Barroso
Fatalista (O), João Botelho
Juventude em Marcha, Pedro Costa
Rasganço, de Raquel Freire
Sorrisos do Destino, Fernando Lopes
Até Amanhã, Camaradas, Joaquim Leitão
Capitães de Abril, de Maria de Medeiros
Vai e Vem, João César Monteiro
Espelho Mágico, Manoel de Oliveira
Água e Sal, Teresa Villaverde

E ainda João Canijo, Margarida Cardoso, Margarida Gil, Fonseca e Costa, Miguel Mozos, Miguel Gomes, João Pedro Rodrigues, etc

quarta-feira, 5 de maio de 2010

THE TIME THAT REMAINS, de Eli Suleiman

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“THE TIME THAT REMAINS” (O Tempo Que Resta), de Eli Suleiman, (FRA/PAL) *** (3)

Uma interessante obra, auto-biográfica, de um realizador palestiniano, vivendo em Israel, nos territórios ocupados (Nazaré).
Com algumas cenas admiráveis, em especial as que mostram os pais do realizador, a quem este dedica à obra. Particularmente fortes as que mostram a tortura a que eram submetidos os patriotas palestinianos pelos militares israelitas durante a ocupação, para os tentar forçar a denunciar outros camaradas, e que acabavam em fuzilamento ou lançamento para a morte das muralhas da prisão. Os que, por milagre, escapavam ficavam com sequelas físicas para toda a vida.  
Mas fez-nos no entanto lembrar, com as devidas diferenças de contexto social e político, o cinema português anti-fascista, pelo recurso a um certo simbolismo para fugir à todo-poderosa censura (como exemplo, uma das obras-primas de José Fonseca e Costa, um dos grandes cineastas portugueses, “O Recado”). Talvez por isso as grandes figuras da Resistência Palestiniana estejam ausentes. Apenas o Presidente Nasser, símbolo maior para todos os árabes progressistas, surge referido no filme, em imagens do seu falecimento e funeral.
Suleiman utiliza uma espécie de caricatura, mais ou menos suave, para descrever a situação em que se encontra o seu povo, que afinal não é muito diferente de qualquer outro, em situação semelhante, depois de invasão e ocupação do seu país, há mais de 60 anos, desde que as grandes potências ocidentais decidiram criar o estado de Israel na Palestina, mesmo que para isso fosse necessário colocar os palestinianos em campos de refugiados, durante mais de meio século (e por quanto tempo mais?)!
Suleiman utiliza uma cena de “Spartacus”, com um célebre beijo entre Kirk Douglas e Jean Simmons, para caricaturar o conservadorismo das escolas hebraicas, com a professora a tentar esconder o beijo, dos alunos. No entanto houve um crítico de uma prestigiada revista de cinema (no melhor pano cai a nódoa…) que confundiu “Spartacus” com “Os 10 Mandamentos”!!! Distinguir Kubrick do, por muitos motivos, pouco recordável, Cecil B. DeMille, não parece tarefa difícil para qualquer cinéfilo. Não distinguir Jean Simmons de Anne Baxter já pode acontecer… Mas confundir o grande actor Kirk Douglas com o “canastrão” Charlton Heston é inconcebível, mesmo para um ocasional visitante ignorante das salas de cinema!
*** (3)


EXPOSIÇÃO NA TORRE DO TOMBO

UMA EXPOSIÇÃO – “Cada fio de vontade são dois braços e cada braço uma alavanca” (versos da canção revolucionária “Hino de Caxias”)
***** (5)

A imprensa manuscrita, produzida por militantes comunistas, nas prisões do fascismo (anos 30 e 40, do século XX), na Torre do Tombo. Estima-se que tenham sido feitos mais de 200 números.
Os jornais feitos à mão, nas prisões fascistas, pelos militantes revolucionários, comunistas, constituem uma enorme lição de coragem, nas condições mais adversas. Jornais sempre com elevado nível teórico e gráfico.
Em Setembro de 1935, o “Le Monde”, quotidiano francês, escrevia: são “documentos únicos na história do movimento revolucionário” e “não conhecemos outro caso de publicações produzidas no interior de cadeias fascistas de outros países”.
Imperdível esta exposição, constituída por documentação cedida para a exposição pelo Partido Comunista Português. Nela se podem consultar vários exemplares digitalizados. Só até ao fim deste mês de Maio.
***** (5)

TUNING, de Rodrigo Francisco


“TUNING”, de Rodrigo Francisco, encenação de Joaquim Benite, CTA, **** (4) 

Uma peça de um jovem dramaturgo almadense (1981), colaborador da Companhia de Teatro de Almada, que, em nossa opinião, uma vez transposta para o palco, nada fica a dever às obras sobre a actualidade, que nos chegam do estrangeiro, da nova geração de dramaturgos. 
Os sombrios tempos que atravessamos, nesta Europa dominada pelos grandes interesses económicos, que penalizam brutalmente as populações para manter os faraónicos lucros do grande capital e dos seus dirigentes (vide caso da Grécia) e o que eles oferecem à juventude oriunda dos extractos mais desfavorecidos da sociedade. Da sua falta de perspectivas e de saídas. Eis o fortíssimo tema da peça de Rodrigo Francisco.
Apresentada na Sala de Ensaios, transformada por Jean-Guy Lecat, numa modesta oficina de automóveis, a que não faltam carros e de onde se vê a rua verdadeira, beneficiando de uma magnífica prestação dos seus cinco actores e da encenação de Joaquim Benite, é um espectáculo que sobe num crescendo, com laivos de tragédia, que tocam o espectador. 
Um espectáculo muito realista, que deixa aos espectadores a tarefa de pensar no que fazer para mudar esta situação.Uma vez mais um magnífico espectáculo da CTA, em que a encenação optou inteligentemente pelo pequeno espaço da Sala de Ensaios, com resultados brilhantes.**** (4)

RUÍNAS, de Manuel Mozos


“RUÍNAS”, de Manuel Mozos, (POR), ** (2)

São imagens, por vezes paradoxalmente belas, de um universo de decadência, decrepitude, abandono, ruína. Tem a ver com a sociedade portuguesa dos meados do século passado, em lugares que outrora foram de luxo, para a grande burguesia desses tempos, e até alguns bairros populares como a Cova do Vapor, na margem esquerda do Tejo.
Leva-nos a reflectir sobre o inevitável envelhecimento das cidades, das casas, das coisas, onde vivemos e de que nos servimos e que não deixamos de olhar com uma certa melancolia, e com que nos deparamos ao deambular pelos bairros históricos da nossa cidade.
Mas, acima de tudo, o que nos custa mais suportar é quando há falência de projectos sociais meritórios, que as novas condições económicas e sociais desactualizam, como certos bairros cooperativos.
O tema da obra tem muito de pessoal. As nossas ruínas, as interiores e as externas, às vezes não coincidem com de outras pessoas. A menos que haja um universalismo nelas, como em obras extraordinárias vistas recentemente – “Of Time and The City” (Terence Davies) e “LÁimée” (Arnaud Desplechin).
A ver ** (2)
Em complemento uma curta-metragem, "Canção de Amor e Saúde" de João Nicolau, que colaborou na fotografia de “Ruínas” e que começa com brilhante longo plano único que, só ele, justifica uma visão.